segunda-feira, 4 de novembro de 2024

- Ó mãe, mãe... (Eugénio de Andrade)

 

Certa manhã acordei sozinho em casa. Acordei a chorar. 

- Ó mãe, mãe... 

Mas a mãe não vinha. Não havia mãe. Havia só porta fechada, 

- Ó mãe, mãe... 

E a casa deserta. Pelas frinchas largas da porta via a manhã lá fora. 

Era uma manhã de sol quente talvez de Julho, talvez de Agosto. 

Devia haver medas de palha na eira em frente. 

Mas os meus olhos mal viam, estavam rasos de água e de angústia.

 - Ó mãe, mãe...

E de repente, na manhã clara, começaram a cair estrelas pequeninas, 

estrelas verdes, vermelhas, estrelas de oiro. 

As lágrimas caíam-me pela cara. 

- Ó mãe, mãe...

O nariz esmagado contra a porta, os olhos muito abertos, 

vendo através das frinchas as estrelas caindo, umas atrás das outras.

- Ó mãe, mãe...

E ninguém me abriu a porta para apanhar as estrelas. 

Nem mesmo tu, mãe, que a essas horas andavas a ganhar o pão 

para a boca daquele que hoje te oferece estes versos.


Eugénio de Andrade

In “Os Amantes sem Dinheiro”

via Emília Roque

Namorar depois dos 50

 


Em nossa idade, depois do meio século, o amor já percorreu estradas, dobrou esquinas e optou em encruzilhadas... Já errou, já acertou, já deslizou, já se arrependeu e, inevitavelmente, o tempo se foi.

 

Viveu-se o amor, perdeu-se o amor, alguns pelas mãos de Deus, outros pelo enfraquecimento do viver a dois. Hoje o nosso olhar em direção ao amor continua mais lindo, pois na longa caminhada dos sentimentos, aprendemos a somar, a dividir e a multiplicar, sem chances de diminuir no conhecimento do sentimento do amor.


O amor maduro chega de mansinho e se aloja em nossa vida, sem tempo para acabar. O caminhar a dois é mais sereno, a cumplicidade existe, o carinho é mais espontâneo, não nos inibimos diante do querer, a sintonia é completa e as lembranças são depositadas no álbum das saudades, que guardamos, de um tempo que não volta mais.


Namorar na nossa idade é carregar a ternura no olhar. O brilho é mais intenso, a vontade de acertar é mais forte. A construção do caminhar a dois é a soma do querer, é o encontro de duas almas aplaudidas por dois corações que dividem a emoção de amar. As pequeninas atitudes, os gestos e os detalhes são os alimentos que sustentam este amor. Viver a dois é a alegria da companhia, do chamego dengoso, dos beijos ainda calientes, dos insinuantes olhares quando o desejo se manifesta e a promessa no olhar de que em todo amanhecer, será o mais belo bom dia entre dois seres que encontraram o amor. Amar nunca é demais. 


Feliz daquele que tem um enorme coração, capaz de amar, amar, amar e acima de tudo saber ser amado... Faça o dia, a tarde, a noite do seu bem ser memorável!


D. A. 

via Espaço sagrado mãos que curam (DD)