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terça-feira, 15 de agosto de 2023

Elegia

Às vezes era bom que tu viesses.
Falavas de tudo com modos naturais:
em ti havia 
a harmonia 
dos frutos e dos animais.

Maio trouxe cravos como outrora,
cravos morenos, como tu dizias,
mas cada hora 
passa e não se demora 
na tristeza das nossas alegrias.

Ainda sabemos cantar,
só a nossa voz é que mudou:
somos agora mais lentos,
mais amargos,
um novo gesto é igual ao que passou.

Um verso já não é a maravilha,
um corpo já não é a plenitude,
tu quebraste o ritmo, o ardor,
ao partires um a um 
os ramos todos da tua juventude.

Não estamos sós:
setembro traz ainda 
um fruto em cada mão.

Mas os homens, as aves e os ventos 
já não bebem em ti a direcção.
~Eugénio de Andrade in POESIA 
Amantes sem dinheiro, 1950