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quarta-feira, 11 de dezembro de 2024

Deus fala calando-se


 

1. Tão simples — e tão belo — é escutar. Mas coisa cada vez mais rara é calar.

Nestes dias de correria, parece que espatifamos o silêncio. Desaprendemos de ouvir e já não sabemos calar.

2. A palavra é tão preciosa que nunca deveríamos desperdiçá-la. A palavra não é só para usar. Deveria ser também — e bastante — para guardar.

Se as palavras estão constantemente a sair de nós, que se pode, de relevante, encontrar em nós? Só a palavra que não é banalizada merece atenção cuidada.

3. Acontece que, nesta vida tão intensa, o silêncio não goza de boa imprensa.

Só se fala de quem fala. Quem fala de quem (se) cala? Para muitos, calar é não ser, é quase não existir.

4. Em permanente conspiração contra o silêncio, nem sequer percebemos que aquele que fala também precisa daquele que (se) cala.

Como pode haver comunicação com palavras em contínua — e ruidosa —sobreposição?

5. O paroxismo deste cenário está nas entrevistas televisivas. Que disponibilidade mostram os entrevistadores para ouvir os entrevistados?

Como é possível responder se há quem esteja sempre a interromper?

6. Para nós, hoje, a palavra é apenas som. A sua eficácia não é procurada na razão que transporta, mas no ruído que provoca e no volume que atinge.

É por isso que, muitas vezes, o diálogo é substituído pelo protesto. Pensa-se que mais alcança quem mais grita.

7. Sucede que a palavra não é apenas som. Nem principalmente som.

Como bem notou São João da Cruz, Deus só proferiu uma Palavra — o Seu Filho — e proferiu-A em silêncio. Foi no Seu eterno silêncio que Deus disse tudo.

8. Olhemos para o silêncio de Belém e aprendamos com Deus, que fala calando-Se.

O Natal é a festa do silêncio que fala. A divina Palavra acampou no silêncio do Menino que nasceu, do Filho que nos foi dado (cf. Is 9, 6).

9. Não consta que os Magos abrissem a boca quando viram Jesus (cf. Mt 2, 11). Diante do silêncio que se faz Palavra, as nossas palavras só podem fazer silêncio.

Necessitamos de uma «pastoral da gestação» (Philippe Bacq) que nos reaproxime do silencioso «mistério da geração» (São Guerrico).

10. Os nossos encontros ainda são demasiado palavrosos. Habituemo-nos, pois, a estar com o Senhor sem abrir os lábios.

Um pouco de silêncio com Deus consegue (infinitamente) mais do que muitas palavras sobre Deus!


~Pe João António Pinheiro Teixeira



quinta-feira, 3 de outubro de 2024

Sobre a Oração de São Francisco de Assis




A Oração de S. Francisco não foi composta por S. Francisco. Ou, melhor, até foi se pensarmos que as suas ideias estão lá contidas. Foi ele que a inspirou. Mas a oração como tal é do início do século XX.

Foi em 1913 que ela surgiu numa revista da Normandia (França). Apareceu sem menção do autor e transcrita já de uma outra revista. Começou a tornar-se popular a partir de 20 de Janeiro de 1916 quando surgiu no L' Osservatore Romano. Sabemos que ela tinha sido remetida ao Papa Bento XV pelo Marquês de la Rouchetulon.

Estávamos em plena I Guerra Mundial. Por toda a parte havia orações pela paz. Quando esta oração figurou no jornal da Santa Sé, um franciscano mandou imprimir uma pagela contendo a imagem de S. Francisco de um lado e a Oração pela Paz do outro.

No fim, vinha uma pequena frase: «Esta oração resume os ideais franciscanos e, ao mesmo tempo, representa uma resposta às urgências do nosso tempo».

Aí está a explicação para a colagem da oração a S. Francisco.


~Pe João António Pinheiro Teixeira






domingo, 8 de setembro de 2024

A Mãe nasceu

 

Natividade de Nossa Senhora

E eis que chegámos ao dia de Natal. 


Sim. Eis-nos chegados ao Natal de Maria, ao Natal da Mãe.

 

O caminho de 8 de Setembro a 25 de Dezembro mimetiza o caminho de Maria até Jesus. 


O Natal começa hoje. 


Feliz Natal desde já. Feliz Natal para sempre. 


A Mãe nasceu. Para fazer nascer o Filho. 


Ela faz anos. E somos nós que recebemos o presente, o melhor presente: Jesus!


fonte: Pe João António Pinheiro Teixeira


mural de Pe João António Pinheiro Teixeira








quarta-feira, 4 de setembro de 2024

Mais um

 



Em 1979, ao voltar da Noruega após ter recebido o Prémio Nobel da Paz, Madre Teresa de Calcutá passou pela casa das Missionárias da Caridade em Roma, onde um jornalista lhe fez uma pergunta inquietante: «Madre, a senhora tem setenta anos. Quando morrer, o mundo vai ser como antes. O que mudou depois de tanto esforço?» Madre Teresa respondeu: «Eu nunca pensei que poderia mudar o mundo. Eu só tentei ser uma gota de água limpa em que pudesse brilhar o amor de Deus. Acha pouco?» O repórter não conseguiu responder. Madre Teresa retomou a palavra e fez um pedido ao repórter: «Tente, você também, ser uma gota limpa e, assim, seremos dois. Você é casado?» «Sim, Madre». «Então, peça à sua esposa e assim seremos três. Tem filhos?» «Três filhos, Madre». «Peça igualmente aos seus três filhos e assim seremos seis». Eis uma lição muito bela, muito simples e muito prática. Para a viver, basta querer. De preferência, a partir de hoje!


fonte: Padre João António Pinheiro Teixeira


Há um só Deus e Ele é Deus para todos; portanto, é importante que todos sejam vistos como iguais perante Deus. Eu sempre disse que devemos ajudar um hindu tornar-se um melhor hindu, um mulçumano, um melhor mulçumano, um católico, um melhor católico. Nós acreditamos que nosso trabalho deve ser nosso exemplo às pessoas. Temos entre nós 475 almas – 30 famílias são católicas e o resto são hindus, mulçumanos, sikhs – todos de religiões diferentes. Mas todos vêm para nossas orações (A Simple Path, Madre Teresa, 1995 – sem tradução para português).


via Marcos Monteiro (WhatsApp)





segunda-feira, 19 de agosto de 2024

mastigar os minutos

 


É com indisfarçável melancolia que nós, os mais adiantados na idade, recordamos as chamadas férias grandes.

Perdido nas memórias mas alojado na alma, este era um tempo em que tempo havia. 

Era o tempo em que o tempo sobrava, em que o tempo parecia nunca faltar.

Era o tempo em que o tempo não nos tinha. Nós é que tínhamos tempo. Para tudo. Ou quase.

Era um tempo totalmente diferente para os padrões actuais. Não se pensava em viagens. O dinheiro escasseava e as oportunidades não abundavam.

A preocupação não era ocupar o tempo. Era sobretudo sentir o tempo. Saborear o tempo. Digerir o tempo.

Nas férias, o tempo parecia desistir de passar. Dir-se-ia que também repousava. 

Não voava, como hoje. Dávamos conta de cada segundo. Os minutos eram tão mastigados que até pareciam esticar as horas.


Pe João António Pinheiro Teixeira





sábado, 17 de agosto de 2024

A vida não te é tirada

 

Quem participa nas Missas exequiais sabe que uma das frases mais emblemáticas de um dos prefácios é a que proclama que «a vida não acaba, apenas se transforma» (vita non tollitur, sed mutatur). O que não talvez não se saiba é a origem desta expressão. Ela vem já do século III e pertence a uma mãe. As mães são sempre sábias. Foi, de facto, a mãe de Sinforiano que, vendo o filho a ser julgado pelo crime de ser cristão, animou o filho a que não vacilasse na fé, nas convicções. Curiosamente, o pretexto fora a recusa de Sinforiano em prestar culto àquela que era apontada como mãe dos deuses: Cibeles. Eis o que lhe disse a progenitora: «Renova a tua constância. Não podemos temer uma morte que nos leva, com certeza, à vida. Mantém alto o teu coração, meu filho, olha para Aquele que reina nos Céus. Hoje, a vida não te é tirada; é mudada numa melhor»!


Pe João António Pinheiro Teixeira



segunda-feira, 4 de março de 2024

Exactamente como as mães!!

 

Porque a solidão é uma espécie de fim, Deus — tal como as mães — corre os dias inteiros à janela e escuta. Qualquer bulício Lhe acelera o coração


EXACTAMENTE COMO AS MÃES!!


1. Em «Deus na escuridão» — a sua última e talvez mais prodigiosa obra — Valter Hugo Mãe não tem dúvidas.

«Deus é exactamente como as mães. Liberta Seus filhos e haverá de buscá-los eternamente».


2. Deus é como as mães, «que criam e depois vão ficando para trás, à distância, numa distância que parece significar que não são mais precisas».

Também Deus vai criando memórias, «para que os filhos se lembrem d’Ele mesmo em lugares onde nunca haviam estado antes».


3. Até Deus jornadeará pelas estradas da escuridão. 

«E tacteia por toda a parte na vontade intensa de um toque, do aconchego do corpo dos filhos, um gentil toque ou um abraço».


4. E os filhos? Esses «distraem-se e são incautos ou tornam-se impuros e fogem, atarefados com as suas paixões e incertezas».

Pensam menos «no quanto Deus pode sofrer do que no sofrimento que haverão eles de sentir pela mais pequena contrariedade».


5. Efectivamente, «os filhos partem sem saberem que o sentido da vida é chegar à origem». Por vezes, lembram que o amor «lhes foi colocado no peito com generosidade».

Contudo, equivocando-se, «julgam que o amor é o consumo da vida, o imediato que observam, a evidência de se verem acompanhados».


6. Esquecem-se de que «a verdadeira companhia encontra sempre um modo de chegar a casa». Os filhos «partem para mais longe buscando o que, afinal, ficara lá trás».

Mesmo assim, «Deus nunca culpa os filhos, mesmo que toda a gente o fizesse». E quer apenas «entregar alegrias».


7. Porque «a solidão é uma espécie de fim», Deus — tal como as mães — «corre os dias inteiros à janela e escuta. Qualquer bulício Lhe acelera o coração».

Se existem passos em redor, «se alguma voz O chama, palpita […] de alegria na esperança de ter um filho em visita».


8. Por isso, «Deus quer tudo em sossego, sem sobressalto, porque sabe apenas estar à espera de ser correspondido no amor».

Como as mães, «Deus arruma a Sua casa, tem sempre as camas prontas, alguma fruta na mesa […] para oferecer à boca de um filho. A fome de um filho é prioritária, contra leões e tempestades».


9. Daí que «a casa de Deus tenha a chave do lado de fora».

Também este é «um tique das mães que dormem lá dentro, vulneráveis a qualquer ladrão em troca da oportunidade de, ao menos uma vez, um filho voltar, pegar na chave e entrar».


10. Há um tempo em que encontramos Deus na casa da nossa Mãe. 

Até que chega o tempo de reencontrar a nossa Mãe na casa de Deus. Que será a nossa também. Para sempre!

~Pe João António Pinheiro Teixeira



quinta-feira, 21 de setembro de 2023

O mais difícil é encobri-Lo

Só entrei verdadeiramente em contacto com Xavier Zubiri após a sua morte, ocorrida faz hoje 40 anos.

Foi o título de um dos seus livros que me aproximou dele. Sobretudo aquele «y» de «El hombre y Dios».


Para ele, acerca de Deus, «o mais difícil não é descobri-Lo; é encobri-Lo».


Tudo fala de Deus. Até a Sua alegada ausência.


Porque Deus, quanto mais Se esconde, mais Se revela.


Uma das frases que Zubiri mais citava era um pensamento de Santo Agostinho: «Procuremos. Procuremos como quem há-de encontrar e encontremos como quem há-de voltar a procurar. Pois é quando parece que tudo acaba que tudo verdadeiramente começa».

fonte: mural de João António Pinheiro Teixeira

Xavier Zubiri (1898-1983)


sexta-feira, 25 de agosto de 2023

Peço-Te

 

Chamo-Te porque tudo está ainda no princípio

E suportar é o tempo mais comprido.

Peço-Te que venhas e me dês a liberdade,

Que um só de Teus olhares me purifique e acabe.

Há muitas coisas que não quero ver.

Peço-Te que sejas o presente.

Peço-Te que inundes tudo.

E que o Teu reino antes do tempo venha

E se derrame sobre a Terra

Em Primavera feroz precipitado.


Sophia de Mello Breyner Andresen

mural JAPT


quinta-feira, 15 de junho de 2023

Até Camões cantou Maria

Para se namorar do que criou,
Te fez Deus, sacra Fénix, Virgem pura.
Vede que tal seria esta feitura
Que para si o seu Feitor guardou!

No seu alto conceito Te formou
Primeiro que a primeira criatura,
Para que única fosse a compostura
Que de tão longo tempo se estudou.

Não sei se digo em tudo quanto baste
Para exprimir as raras qualidades
Que quis criar em Ti quem Tu criaste.

És Filha, és Mãe e Esposa: e se alcançaste,
Uma só, três tão altas qualidades,
Foi porque a Três de Um só tanto agradaste.

~Luís Vaz de Camões 

Mural de Pe João António Pinheiro Teixeira