segunda-feira, 29 de dezembro de 2025

Natal: uma Saudação Incómoda


Meus irmãos e minhas irmãs,


Faltaria ao meu dever se vos desejasse um "Feliz Natal" sem vos inquietar a alma. Recuso-me a oferecer saudações vazias, protocolares, presas apenas à folha do calendário. Por isso, entrego-vos os meus votos: profundos, verdadeiros e, acima de tudo, incómodos.


Que o Menino Jesus, nascido por puro amor, vos sacuda desta vida egoísta e cinzenta, onde falta a coragem das alturas. Que Ele vos conceda a graça de reinventarem a vossa existência através da entrega, do silêncio e da oração que não pede, mas que se oferece.


Que o Recém-nascido deitado na palha vos roube o sono. Que sintais o vosso travesseiro tão duro como a pedra enquanto não acolherdes, com verdade, o desalojado e o pobre que deambula pelas nossas ruas, órfão da nossa compaixão.


Que o Deus feito Carne vos pese no peito sempre que o orgulho ou a carreira se tornarem os vossos ídolos; sempre que o vosso projeto de vida for atropelar o próximo ou usar as costas do outro como degrau para a vossa subida.


Que Maria, que apenas encontrou estrume e palha para o Filho que carregava, vos obrigue — com aquele seu olhar ferido — a suspender as festas e os brindes até que a consciência desperte. Até que vejais, finalmente, as vidas que exterminamos nas margens da nossa indiferença.


Que José, rosto de tantas portas fechadas, vos confronte com o desperdício obsceno e com o exagero da nossa abundância. Que ele vos faça sentir a dor dos pais que choram por filhos sem saúde, sem trabalho e sem futuro.


Que os Anjos, mensageiros da paz, tragam a guerra à vossa tranquilidade sonolenta. Que o vosso silêncio cúmplice seja quebrado perante as injustiças, o fabrico de armas e a condenação de povos inteiros à fome e ao esquecimento.


Que os pobres que correm para Belém, enquanto os poderosos conspiram na sombra, vos despertem. Que percebais que a "Grande Luz" exige que nos levantemos e partamos. As esmolas de quem lucra não aquecem a alma, e o escândalo da riqueza especulativa ao lado da miséria extrema é um grito que chega aos olhos de Deus.


Que os pastores, vigilantes no silêncio da noite, vos ensinem a emoção do abandono em Deus. Que vos inspirem a viver pobres em espírito, porque só assim se morre rico perante o Criador.


Que, neste nosso mundo tão cansado, nasça finalmente a Esperança. 

Aquela que arde e transforma.


P. João Torres

(texto adaptado de D. Tonino Bello que serviu como bispo de Molfetta-Ruvo-Giovinazzo-Terlizzi de 1982 até sua morte em 1993.


fonte: P. João Torres






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